Municípios mineiros com menos de 20 mil habitantes RECEBEM banda larga sem-fio, bancada pelo governo do estado. Patrícia Cornils*
ARede nº59, junho 2010 –O município de Rio Preto fica na Serra da Mantiqueira, em Minas Gerais, ao lado do rio Preto, que faz divisa com o Rio de Janeiro. Ali moram seis mil pessoas, 5 mil das quais na área urbana. A cidade é uma das 11 escolhidas para a realização do projeto-piloto do programa Minas Digital, uma iniciativa do governo para, por meio de parcerias público-privadas, levar banda larga a municípios mineiros com menos de 20 mil habitantes. Minas Gerais é um estado de pequenas cidades: 688 de seus 853 municípios têm menos de 20 mil habitantes. Com um mercado potencial pequeno, de duas ou três centenas de usuários de acesso à banda larga, além das prefeituras, esses municípios não são atendidos pela Oi, a concessionária da região, nem por nenhuma outra grande provedora de conexão à internet em banda larga. O programa pretende solucionar essa questão e, até 2011, conectar 120 dessas cidades.
O governo acredita que o Minas Digital vai contribuir com o desenvolvimento do estado, explica Vicente José Gamarano, subsecretário de Inovação e Inclusão Digital de Minas Gerais. Essa contribuição acontece de três maneiras. Primeiro, a implantação de infraestrutura vai atender o desejo da maioria da população, principalmente dos jovens, de acesso à internet e de participação em redes sociais. Além disso, a expectativa é que o programa também apoie o processo de inovação no estado, por meio de projetos como o Teia MG, uma rede criada pelo próprio governo e formada por prestadores de serviços que, usando ferramentas e aplicativos da Web 2.0, auxiliam empresas, escolas, associações, sindicatos, departamentos governamentais e todos os participantes das comunidades locais a trabalhar seus projetos na internet. Em terceiro lugar, mas não menos importante, a internet é necessária para apoiar o desenvolvimento de arranjos produtivos locais e promover a expansão do ensino à distância, enumera Gamarano.
O programa foi estruturado por meio de parcerias entre o governo do estado, as prefeituras e empresas de provimento de conexão à internet. O governo do estado articula as parcerias e investe na implantação de redes sem fio nas cidades. As prefeituras passam a ser usuárias da rede de banda larga, o que contribui para sua modernização. A administração pública depende completamente da internet para as mais variadas coisas, desde serviços ao cidadão, como o diagnóstico à distância de eletrocardiogramas, até a prestação de contas em convênios com o governo federal, explica Edmar Wilson Bastos Silva, prefeito de Rio Preto. Lá, seis meses atrás, a prefeitura usava conexões discadas para tudo e a conta mensal era de R$ 1,8 mil por mês. Hoje a conexão para o poder público ainda é paga pelo governo do Estado, mas custaria, em banda larga, R$ 2 mil a R$ 2,5 mil por mês.
Além de oferecer mais e melhores serviços aos cidadãos, a prefeitura se convenia com o terceiro protagonista das parcerias, uma empresa que tenha licença para prestar serviços de comunicação multimídia. Esta empresa privada fica com a obrigação de pagar o link com a rede da operadora, fazer a manutenção da rede municipal e vender o acesso a usuários finais 24 horas por dia e sete dias por semana com boa qualidade, a um preço mensal máximo de R$ 49,90 – com o que deve obter retorno para as despesas que essas obrigações implicam. Tem também a obrigação de oferecer gratuitamente, durante duas horas por dia, o acesso à rede. Como a infraestrutura é sem fio, este acesso pode ser feito a partir de qualquer ponto da cidade, desde que o usuário tenha um modem apropriado para tanto.
O que o teste-piloto de Rio Preto mostrou foi que, ao contrário do que muita gente pensa, prestar serviço de acesso com qualidade em pequenas localidades pode ser um bom negócio. Quem diz isso é Guilherme Cunha, diretor comercial da Jevin, que atua no mercado de implantação e operação de redes sem fio. Com cerca de cem clientes em Rio Preto, e podendo chegar a 200, a Jevin deverá recuperar, em mais dois ou três meses, o investimento que fez para prestar um bom serviço na cidade. Isso porque, além dos cerca de R$ 80 mil investidos pelo governo do estado para implantar a rede sem-fio, a Jevin gastou cerca de R$ 70 mil para que o sinal chegasse a 100% da população. Além disso, paga entre R$ 6 mil e R$ 7 mil pelo link com a rede da Oi, para conectar a rede da cidade à internet. “Nos primeiros dois meses não acreditei, só pensava como ia fazer para sair dessa”, conta Cunha.
PORTAL E ENQUETE
Aos poucos, ele foi descobrindo maneiras de tornar seu serviço acessível para o usuário, em termos de preço, e também de reduzir seus custos. Negociou, com os fornecedores de modems que chegavam às mãos do usuário a R$ 400,00 a unidade, um compromisso de adquirir um certo número de equipamentos e conseguiu reduzir este preço à metade. Criou um portal de notícias da cidade na página de acesso ao serviço e passou a vender publicidade, “que é barata, mas ajuda a pagar as despesas”. Passou a fornecer seu serviço somente na modalidade pré-paga. Custa R$ 49,90 o link de 128 kbps. O portal se tornou um canal de relacionamento com os clientes.
No próximo mês, a Jevin vai realizar, por meio do portal, uma enquete para verificar se os usuários gostariam de links com velocidades maiores e vai fazer as contas para ver se é possível atendê-los a preços razoáveis. “Depois de amortizar o investimento na rede, fico com poucos custos fixos”, explica Cunha. “Descobri que dá para ganhar dinheiro e agora o foco de meu negócio é ir onde ninguém quer ir”, diz ele sobre as cidades pequenas. Para reduzir custos, está pesquisando pontos onde instalar antenas para atender a cinco, seis municípios.
O Minas Digital é realizado, assim como o BH Digital (ver página 35), com recursos de
R$ 20 milhões a serem liberados pelo Ministério da Ciência e Tecnologia. Em seus testes-piloto usou frequências não licenciadas para a transmissão nas redes sem fio dentro das cidades. Agora, decidiu usar os 10 MHz da faixa de 3,5 GHz destinados pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) à administração pública. A Secretaria de Ciência e Tecnologia de Minas Gerais (Sectis), gestora do projeto, pretende, se possível ainda este ano, lançar a licitação para a compra dos equipamentos, dividida em cinco lotes.
Mudanças
De acordo com José Oswaldo Albergaria, diretor de Tecnologia da Subsecretaria de Inovação e Inclusão Digital de Minas, o pré-projeto, bancado pela Secretaria, prevê investimentos de R$ 160 mil, em média, por cidade, a maioria delas localizadas no Norte de Minas e nas regiões dos vales do Jequitinhonha e do Mucuri. Em função da decisão da Anatel de liberar para as administrações públicas os 10 MHz da faixa de 3,5 GHz, o governo de Minas decidiu redesenhar o projeto. “Tivemos problemas de interferência nas faixas de frequência de uso livre”, recorda Albergaria. “Por isso, decidimos usar a nova faixa aberta para a administração pública”, explica. Segundo ele, outro item que será alterado no programa, em função da experiência no piloto, é a licitação do provedor. “Das 11 cidades do piloto, cinco ainda não implantaram a rede por dificuldades em fazer essa licitação – agora, quem vai se responsabilizar por essa fase será a Sectis”, informa.
Se ocorreram alterações no desenho de implantação do programa, o modelo de gestão e contrapartida das prefeituras selecionadas continua o mesmo. Segundo o subsecretário de Inovação e Inclusão Digital, Vicente José Gamarano, o governo do Estado banca a instalação da infraestrutura e o pagamento do link nos primeiros meses. A partir da seleção do provedor, o pagamento do link é por conta da prefeitura. Isso ainda não está acontecendo em Rio Preto. De acordo com o prefeito, quem paga o link, por enquanto, é o governo do estado.
Em relação aos serviços de governo eletrônico, o estado torna disponíveis para as prefeituras os serviços online já existentes. Um dos exemplos citados por Gamarano é o serviço de telemedicina da Secretaria da Saúde. Rio Preto, um dos 11 municípios do piloto, já está oferecendo à população consultas com cardiologistas de Juiz de Fora. Também os cursos do programa de ensino a distância da Sectis serão oferecidos às cidades que integram o Minas Digital.
Se até o final do ano, pela troca de obrigações do Programa de Metas de Universalização da Anatel, as concessionárias terão que ter ponto de presença em todas as sedes de municípios, por que fazer esse investimento? Em primeiro lugar, Albergaria diz que sua experiência de relacionamento com as operadoras (a maior parte do território mineiro é concessão da Oi) não indica que o prazo será cumprido. Em segundo lugar, aponta a qualidade da conexão, indicando que o link oferecido não será suficiente para atender às demandas dessas cidades. Frente a isso, não considera que o Minas Digital é uma duplicação de investimentos. “Temos contato direto com as operadoras e acompanhamos seu calendário”, pondera. “Só vamos puxar o ponto de presença onde não existir ou não for suficiente. Colocar ponto de presença não é garantia de que o serviço poderá ser prestado a toda a cidade.”
* Colaborou Lia Ribeiro Dias