Queda-de-braços em torno do software livre na Europa

Os gigantes da indústria de software proprietário estão inquietos com os planos da União Europeia para incentivar o uso de programas livres nos órgãos de governo.

18/10/2010

Os gigantes da indústria de software proprietário estão inquietos com os planos da União Europeia para incentivar o uso de programas livres nos órgãos de governo.

A Business Software Alliance (BSA), organização que representa essa indústria e que tem, entre seus 80 membros, a Microsoft, a SAP, a IBM, a Dell e a HP, publicou um comunicado em que critica o projeto de revisar o Marco Europeu de Interoperabilidade (EIF, na sigla em inglês) a fim de que os governos apostem, em seus ambientes digitais e na relação com os cidadãos, em programas livres e padrões abertos. A Europa considera que a opção por sistemas livres e abertos contribuiria para ampliar o acesso à informação, proporcionaria uma redução de custos e favoreceria a participação cidadã nos processos de tomada de decisões políticas.

O plano, porém, já é bem mais tímido do que a BSA pretende fazer parecer em seu comunicado e em carta à Comissão Europeia. A Free Software Foundation da Europa (FSFE) refutou, em seu site (em inglês), as argumentações da carta da entidade. Em março, a FSFE já havia publicado uma crítica à proposta do novo marco legal. Argumentava, então, que a Comissão Europeia, no processo de consulta pública sobre a nova regulamentação, aceitou várias contribuições da BSA, a passo que recusou as propostas dos grupos que trabalham a favor do software livre, como os do Open Forum Europe. “A Comissão Europeia abandonou o conceito de padrões abertos como um dos pontos centrais para a interoperabilidade”, dizia a organização.

A aposta em padrões abertos e interoperáveis faz parte da Agenda Digital europeia, mas ainda não existe uma regulamentação clara sobre o que significa isso. Uma das demandas da BSA é que a União Europeia adote um tratamento não-discriminatório entre os fornecedores. A FSFE argumenta, em contraposição, que esse tipo de tratamento não é aplicável a softwares que usam as principais licenças livres: GNU GPL e LGPL; Mozilla Public License; Apache Public License; BSD/MIT e outras licenças ultrapermissivas e EUPL. Isso porque essas licenças fazem uma discriminação, ao não permitir que sejam impostas condições, nos contratos de licenciamento, que façam com que os softwares sob essas licenças deixem de ser livres.

A BSA está preocupada porque essa política pode dar uma vantagem aos sistemas livres nas compras públicas e gostaria que essa política fosse modificada para “assegurar que os inovadores que possuem patentes e outras propriedades intelectuais possam participar do fornecimento de serviços aos governos para o desenvolvimento do governo eletrônico”.

Um executivo da indústria avalia que essa política tem “ecos preocupantes” das regras de compras públicas da China, que dá preferência a empresas que abrem mão de seus direitos de propriedade intelectual sobre um produto. Bruxelas assegura que o plano não implica desprezo aos direitos gerados pelas patentes nem uma obrigação governamental de admitir somente sistemas abertos.

Empresas associadas à ECIS, uma associação internacional que promove ambientes interoperáveis e da qual participam empresas como IBM, Nokia e Oracle, defendem por sua parte que os padrões abertos asseguram que os fornecedores de software de competir em inovação e em preço, em vez de prender os usuários a um ambiente do qual não possam sair ou de tornar os dados inacessíveis caso o governo decida migrar para outro fornecedor.

O contencioso sobre a interoperabilidade teve episódios de repercussão, como a multa a Microsoft por parte da União Europeia por não licenciar seus protocolos a desenvolvedores de software livre a preços razoáveis. Na Espanha, a lei de acesso eletrônico à administração dá ao cidadão o direito de fazê-lo com software livre. (Com informações do El País e da FSFE)

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