É lei: toda escola municipal de
São Paulo tem direito a uma rádio. E a prefeitura criou um conselho
gestor para acompanhar e avaliar as ações do programa Educom.Rádio. Leandro Quintanilha
A rádio da escola Rui Bloim, em São Paulo.
Basta soar o sinal para que um aluno suba as escadas da Escola
Municipal Rui Bloin, no Jardim Santo Elias, zona norte de São Paulo,
para falar ao microfone. Ele lê uma notícia, faz um breve comentário
sobre a última aula e oferece a próxima música a um colega ou
professor. Na rádio da escola, a voz do locutor muda todo dia, mas é
sempre conhecida.
A Rui Bloin é uma das 455 escolas da rede municipal de ensino
fundamental que participa do Educom.Rádio, programa que começou em
2001, sem equipamentos nem previsão de quando – ou se – o material
chegaria. O Núcleo de Comunicação e Educação da Universidade de São
Paulo (NCE-USP) desenvolveu um ousado projeto de capacitação de cerca
de 11 mil professores, alunos e membros da comunidade para implantação
de rádios escolares. Em 2004, terminado o trabalho da USP, o sonho
virou lei, regulamentada em 2005. O prefeito José Serra (PSDB) também
aprovou a formação de um comitê gestor, que vai acompanhar e atuar no
desenvolvimento das ações do Educom.Rádio e deve tomar posse neste mês
de março.
O Conselho Gestor do Educom.Rádio terá mandato de dois anos, e já conta
com alguns integrantes definidos: Terlânia Bruno, do Sindicato dos
Jornalistas de São Paulo e da própria Oboré; e Benedita Terezinha Rosa
de Oliveira, da Secretaria Municipal de Educação. Deve ser composto por
um representante de cada Secretaria envolvida (Educação; Saúde;
Cultura; Esportes; Lazer e Recreação; e Verde e Meio Ambiente), além de
professores da rede de ensino municipal, alunos vinculados a grêmios
estudantis e representantes do Sindicato dos Jornalistas e dos
Radialistas. Entidades de comunicação educativa também podem
participar. As suas atribuições incluem sugerir ações educomunicativas,
estabelecer contato com a Agência Nacional de Telecomunicações
(Anatel), a fim de viabilizar as atividades, acompanhar e avaliar o
Educom.Rádio.
“O que está acontecendo é um caso exemplar de evolução democrática: uma
iniciativa extra-governamental vira projeto de lei, que é aprovado no
final de uma gestão e regulamentado pela seguinte (de orientação
política adversária)”, analisa o jornalista Sergio Gomes, coordenador
do escritório paulista da Associação Mundial de Rádios Comunitárias e
Cidadãs (AMARC) e co-fundador da Oboré, prestadora de serviços
especializada em comunicação popular, que participou do processo de
capacitação dos novos ‘radialistas’.
“O objetivo era favorecer o trabalho colaborativo em grupo, garantindo
um espaço de expressão para a comunidade”, diz o professor Ismar
Soares, do NCE-USP. No curso, professores, voluntários e estudantes
puderam se familiarizar com a técnica jornalística e a linguagem
radiofônica. As aulas, ministradas aos sábados por estudantes de
jornalismo e especialistas convidados, tratavam também de noções de
higiene, saúde pública e meio ambiente, entre diversos temas. Ou
melhor, futuras pautas. Os convidados falavam em esquema de entrevista
coletiva.
O projeto de lei que cria o Educom.Rádio foi proposto pelo então
vereador Carlos Neder (PT), hoje deputado estadual. Aprovada na Câmara,
a lei municipal 13.941 foi sancionada pela prefeita, à época, Marta
Suplicy (PT), em 28 de dezembro de 2004, a três dias do fim de seu
mandato.
Das 455 escolas integrantes, agrupadas em 13 coordenadorias, 183 ainda
não contam com o equipamento de rádio. E, em 2004, o material
radiofônico não era usado em 39% das escolas equipadas, por estar com
defeito ou, simplesmente, abandonado. Procurada por ARede, a Secretaria
Municipal de Educação não apresentou uma previsão sobre quando devem
ser adquiridos os equipamentos restantes, mas a nomeação do comitê
gestor em fevereiro parece ser o primeiro passo para que o problema
seja sanado.
• 455 escolas municipais integram o Educom.Rádio na cidade de São Paulo, organizadas em 13 coordenadorias.
• 11 mil professores, estudantes e membros da comunidade foram
capacitados pelo Núcleo de Comunicação e Educação da USP, entre 2001 e
2004, ao longo de 1.008 encontros.
• O alcance das rádios escolares é de 100 metros. A idéia é ampliá-lo para 1 quilômetro.
• 272 unidades de ensino já contam com o equipamento; 183, ainda não. 39% das que têm o material radiofônico não o utilizam.
• 50% é a estimativa de queda da incidência de depredações e furtos nas escolas em que há iniciativas como as do Educom.Rádio
Além-muros
Desenvoltura para falar
ao microfone.“Há uma clara identificação do secretário Pinotti (José Aristodemo
Pinotti, da pasta municipal da Educação) com o programa”, diz Neder.
Mas ainda faltam, avalia, a definição de um orçamento específico para o
Educom.Rádio e uma integração maior com outras secretarias municipais,
como as de Saúde e Meio Ambiente. A programação das rádios escolares é,
por essência, multidisciplinar. “Só assim o programa cumprirá
completamente o seu papel. Um papel ambicioso. O Educom.Rádio é uma
iniciativa que dialoga com outras duas: o Projeto Vida (Programa de
Prevenção à Violência nas Escolas) e a regulamentação das rádios
comunitárias. Estima-se que iniciativas como a criação de rádios
escolares reduzam pela metade os índices de depredação e furtos nas
escolas”.
Outra grande expectativa dos envolvidos no programa, como adianta o
jornalista Sérgio Gomes, é que o alcance das rádios escolares seja
maior do que o raio de cem metros previsto inicialmente. “Uma pesquisa
recente mostrou que mais de 90% das crianças não gastam mais de dez
minutos para ir de casa para a escola. Com o raio de alcance ampliado
para um quilômetro, as rádios poderão chegar às casas da maioria dos
estudantes”, explica Gomes. Para tanto, seria usado o canal 198 de
radiofreqüência, talvez o último disponível em São Paulo. “Imagine 455
rádios estudantis para informação e entretenimento dos moradores do
entorno de cada escola. Não há nada parecido em nenhum lugar do mundo.”
Para a professora de educação física Sandra Lúcia dos Santos,
capacitada pelo programa para orientar os alunos da Escola Municipal
Rui Bloin, a rádio que funciona em sua unidade de ensino já exerce um
importante papel pedagógico. “Os alunos mais tímidos ou com dificuldade
nos esportes encontraram um excelente meio de expressão – podem falar
sem precisar aparecer”, cita um exemplo. “E, fazendo reportagens,
todos, tímidos ou não, aprendem com mais prazer.”
Os jornalistas-mirins da Rui Bloin fazem entrevistas e cobrem eventos.
“Uns treinam os outros e, assim, o trabalho continua mesmo quando chega
a hora de as primeiras turmas capacitadas deixarem a escola.” No ano
passado, o colégio organizou uma visita ao Centro Educacional da
Cultura Indígena (CECI). As entrevistas com os índios foram um sucesso
e, a partir de então, todos os passeios viraram reportagens em
potencial.
www.radiolivre.org – Rádio Livre
www.brasil.amarc.org – Associação Mundial de Rádios Comunitárias
www.eca.usp.br – Núcleo de Comunicação e Escola USP
www.portaleducacao.prefeitura.sp.gov.br – Secretaria Municipal da Educação