Criada pelos próprios alunos, a rádio da Escola Estadual São Rafael, de
Belo Horizonte, promove a inclusão social de deficientes visuais.
Áurea DejaVu* Mariana Martins** Criada em setembro de 1926, a
Escola Estadual São Rafael, de Belo Horizonte (MG), também conhecida
como Instituto São Rafael, é dedicada, exclusivamente, a educar,
reabilitar e integrar deficientes visuais, recebendo alunos sem limite
de idade: desde bebês até pessoas da terceira idade. E, entre as
iniciativas voltadas para a inclusão social, uma das mais bem-sucedidas
é a Rádio São Rafael, criada pelos próprios alunos, e que tem uma longa
história de lutas.
Anderson: "Cada dia discutimos
um tema diferente".
No começo de 1960, alguns alunos e funcionários, movidos pela
curiosidade e pelo espírito de brincadeira, criaram a primeira
experiência radiofônica na escola. Foi com um transmissor montado por
um dos alunos que a programação começou a ir ao ar para toda a
redondeza. Mas, em 1975, a ditadura militar impediu que a rádio
continuasse, alegando que era uma atividade clandestina. Equipamentos
foram apreendidos e o aparelho transmissor foi lacrado, o que gerou uma
mobilização pela retomada da rádio. No final daquele mesmo ano, os
alunos do curso de Eletrônica do CEFET-MG doaram novos equipamentos e
prestaram assessoria técnica para que a rádio voltasse a funcionar. A
repressão, porém, só permitiu que a programação fosse veiculada através
de alto-falantes, nas dependências da escola.
Juarez Martins, funcionário da biblioteca da escola e um dos criadores
da rádio, conta que, dessa “brincadeira”, saíram alguns locutores e
radialistas. “Meu irmão, Zaino Gomes, vereador, hoje é locutor em Rio
Piracicaba (MG)”, diz.
Em meados da década de 1990, a rádio parou de funcionar novamente, por
conta da defasagem dos equipamentos. Ficou parada até que, em 2003, por
meio de uma parceria com a Associação Imagem Comunitária, foi
implantado o projeto Rádio São Rafael. Nesse projeto, alunos da escola
aprendem técnicas de rádio, discutem temas diversos sobre o cotidiano e
produzem a programação. A transmissão é apenas interna e a programação
aborda assuntos como esportes, saúde, humor, cultura, mercado de
trabalho e dificuldades enfrentadas pelos deficientes visuais.
“Cada dia, discutimos um tema diferente. Muitas vezes, trago alguma
coisa que estou sentindo para ser discutida na oficina”, conta Anderson
Coelho, 21, participante da oficina.
As atividades formativas incluem visitas a outras rádios, exercícios de
expressão musical e vocal e, ainda, dinâmicas para promover o
crescimento pessoal, as relações interpessoais e a preparação
profissional dos alunos. “Posso dizer que estamos testando a aplicação
de uma ‘mídia processo’. Ou seja, o processo de produção e a mudança
que todas essas atividades permitem aos participantes das oficinas são
tão importantes quanto o produto final”, explica Frederico Vieza,
educador do projeto. De acordo com ele, a intenção das oficinas é
permitir que os deficientes conquistem autonomia e independência em sua
vida social. “No próximo semestre, introduziremos uma mudança grande na
turma: vamos misturar não-deficientes com deficientes visuais, para que
a oficina seja mais inclusiva e diversificada”, afirma.
*Articuladora institucional na Associação Imagem Comunitária
** Correspondente da Rede Jovem de Cidadania
www.aic.org.br – Associação Imagem Comunitária
www.redejovembh.org.br – Rede Jovem de Cidadania