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Tecnologias encurtam distâncias e facilitam acesso a  serviços públicos nas comunidades rurais
Luciana Machado

ARede nº75, novembro de 2011 – A vida dos trabalhadores do campo, longe dos grandes centros urbanos, é dura por muitas razões. Grande parte das dificuldades, porém, pode ser sanada com políticas públicas que permitam às comunidades rurais, isoladas em meio a grandes áreas de difícil acesso, desfrutar dos benefícios das Tecnologias da Informação e da Comunicação (TICs).

Essa é a proposta do projeto Territórios Digitais, criado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) em 2008, que leva computadores e conexão à internet até os mais distantes rincões, onde pequenos produtores sobrevivem da agricultura familiar. O programa já implantou 115 centros de acesso gratuito à internet, chamados de Casas Digitais. Beneficiam-se 10.350 famílias, o equivalente a 51.750 brasileiros. De acordo com o Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural, responsável pela iniciativa, 290 novas unidades estão sendo entregues ainda este ano. A meta é chegar a 2.050 Casas Digitais até o final de 2014.

Os telecentros são instalados em espaços que pertencem às comunidades. Estratégia eficaz para que a população local se aproprie do equipamento e se comprometa com a sustentabilidade da iniciativa. Antes das primeiras orientações para lidar com as máquinas, os usuários aprendem que a tecnologia é apenas um veículo – e não um fim, em si. A lição inicial consiste em um exercício de reflexão importante, inédito para muitos desses trabalhadores rurais, em geral, com baixa escolarização: eles são estimulados a identificar e expressar suas dificuldades no trabalho e a traçar seus objetivos para o futuro. Só depois dessa contextualização é que são apresentados aos principais aplicativos e começam a colocar a mão na massa, no caso, “no mouse”.

Uma das atividades estratégicas do programa é a construção de um blog da comunidade que recebe a Casa Digital, uma ferramenta tecnológica que adquire grande valor para o pequeno agricultor. Porque ele pode postar, na página, informações sobre seus produtos e oferecer fora da sua região geográfica, ampliando os horizontes de comercialização. “A produção pode ser vendida a qualquer um que tenha acesso à rede. Imagine o que isso potencializa os negócios”, diz Rossana Moura, gestora do projeto. Além de abrir oportunidades, o blog viabiliza a compra e a venda diretas. Ou seja, os produtores podem evitar os atravessadores – comerciantes que se colocam entre os pequenos produtores e os grandes comerciantes, aumentando o custo do produto, sem beneficiar quem o produz – tanto para comprar insumos, quanto para colocar a produção no mercado.

Todos os blogs criados pelo projeto Territórios Digitais são integrados em uma grande rede. Comunidades do Acre entram em contato com comunidades do Rio Grande do Sul. Embora diferentes no clima, na cultura e na produção, muitas vezes compartilham os mesmos problemas e a experiência de um pode ajudar o outro, não importa onde estejam. “Essa troca de informações promove o desenvolvimento”, afirma Rossana.

Os blogs das comunidades também abrigam uma espécie de agenda cultural e social. Os mais jovens, em especial, consultam diariamente para ficar por dentro do que acontece: detalhes sobre a festa da padroeira, o dia da vaquejada ou quem está se casando na cidade. Não faltam mensagens sobre a vidaa no campo, poesias e até foto de algum solteirão inveterado à procura de uma donzela.

Outro grande ganho da internet para quem vive em terras afastadas é facilitar o acesso aos serviços públicos. “Em muitos casos, são dezenas de quilômetros até o município mais próximo ou centenas até a sede do estado”, relata Rossana. Um dos serviços mais procurados pela população atendida nas Casas Digitais é o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) – linha de financiamento para compra de máquinas, gerenciamento de produção ou para implantação de processos que agreguem mais valor aos produtos.

Para se candidatar a receber uma Casa Digital, a comunidade deve estar em uma das áreas rurais de menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do país, de acordo com o mapeamento do programa Territórios da Cidadania (www.territoriosdacidadania.gov.br), do governo federal. Para abrigar o telecentro, basta uma sala que acomode o kit composto por onze computadores (onde rodam softwares livres), um servidor, mesas, cadeiras, impressoras e armários. A gestão local da unidade é de responsabilidade da comunidade. “Os moradores abraçam o projeto porque se sentem donos de tudo aquilo”, conta Rossana. São eles que se revezam nos plantões para que a Casa Digital esteja aberta boa parte do dia.

José Filho, é um dos mais antigos gestores de Casas Digitais. Ele atua na unidade do assentamento Santana, no Ceará, uma comunidade com 89 famílias. Eles cultivam milho e feijão, criam caprinos e bovinos e ainda se dedicam à produção de mel. Sem recursos para se comunicar antes da chegada do projeto, essa gente vivia praticamente ilhada. “Havia apenas um orelhão público”, diz José Filho, hoje um dos monitores mais atuantes. A Casa Digital trouxe não só viabilidade de comércio, mas também uma escola de ensino médio para a região. “A gente quer acabar com aquela visão de que uma região rural tem de ser atrasada”, afirma Filho.

www.mda.gov.br/territoriosdigitais

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