Sobram vagas e falta capacitação

Cresce a demanda por profissionais de software, e o MCT estuda a criação de um plano para formar recursos humanos em larga escala na área de programação e desenvolvimento. Mas ainda não há capacitação massiva em software livre.


Cresce a demanda por
profissionais de software, e o MCT estuda a criação de um plano para
formar recursos humanos em larga escala na área de programação e
desenvolvimento. Mas ainda não há capacitação massiva em software
livre.

Leandro Quintanilha e Verônica Couto


Google, IBM, Tata, Nokia, CI&T, várias outras empresas da área de
tecnologia da informação estão contratando. E tudo indica que “aprender
informática” aumenta mesmo, e muito, a chance de conseguir emprego. Mas
não se trata de editor de texto, planilhas e aplicativos básicos, ou
saber navegar na internet — currículo da maioria das oficinas
oferecidas em telecentros e outros programas de inclusão digital. Longe
disso. Estamos falando de conhecimento avançado, de aprender a mexer
com Java, Phyton, PHP, Debian, TCP/IP, Shell, C, C++, entre outros
sistemas de código aberto que lideram a procura por quadros nas
corporações e que poderiam estar sendo ensinados em escolas de ensino
médio. Porque falta profissional de soft­ware. O Ministério da Ciência
e Tecnologia está elaborando um Programa de Formação de Capital Humano
em Software, que vai cobrir plataformas livres e proprietárias. Mas, no
primeiro piloto, iniciado este ano, Java é a única linguagem aberta
contemplada. A base instalada Linux no Brasil, por sua vez, cresce 30%
ao ano e já está em 64% das empresas brasileiras, segundo a IDC (veja a
página 12).

“Não é um Programa específico para software livre. O software livre é
apenas um modelo de empreendimento que, de alguma forma, precisa de
pessoas competentes no desenvolvimento. Não precisa de formação
específica. O que nós queremos é criar um grupo de pessoas capazes de
desenvolver software”, afirma o secretário de Política de Informática
(Sepin) do MCT, Agusto César Gadelha. A ação federal vai ser construída
a partir de estudo realizado pela Softex (ONG para apoio à exportação
de software), e depois que forem avaliados três projetos piloto. No
primeiro deles, o currículo não é genérico, como sugere o titular da
Sepin. Mas traz linguagens e ferramentas específicas nas grades dos
cursos — .Net (da Microsoft), Java e Cobol. A experiência tem gestão da
Brasscom, uma associação de empresas para exportação de software (veja
a página 14), para formar mil técnicos em um ano. O ministério vai
investir R$ 2 milhões em cada ação experimental (R$ 6 milhões no total).

O estudo feito pela Softex identificou, em 2005, um déficit de 17 mil
profissionais, que, com base em um crescimento anual de mercado a 10%,
resultaria, hoje, na falta de 20 mil trabalhadores de software, e de
200 mil até 2012. A política de capacitação de RH que busca o governo
estará focada nas metas de exportação de software — que chegou a ser
fixada em US$ 2 bilhões/ano a partir de 2007, mas que dificilmente será
alcançada (foram US$ 800 milhões em 2006). Enquanto essa política não
vem, a formação no mundo do software livre acontece principalmente de
forma autodidata ou em programas isolados, desenvolvidos por agentes
como o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI),
prefeituras e ONGs. Ou em cursos particulares que custam caro, mas que,
em alguns casos, oferecem bolsas — como no Hakerteen ou na 4Linux (veja
a página 15). As empresas, por sua vez, apostam nas parcerias com
universidades, sinergia que, no entanto, é menos freqüente do que se
gostaria, diz o gerente de negócios do Instituto Nokia, Sandro Alves.

A maioria das fontes ouvidas por ARede destaca que é preciso dar aos
jovens as competências necessárias para ocupar essas oportunidades de
trabalho, e reconhece que há problemas na formação de recursos humanos
em tecnologia no país. De acordo com Marcelo Marques, diretor da
4Linux, o software livre é estratégico, não só pela expansão de seu
uso, mas por se desenvolver em um ambiente de colaboração. Essa
característica, ao gerar uma rede de conhecimentos compartilhados,
promoveria maior capacidade de inovação e de valor agregado na produção
nacional. Também resulta em custos menores, e numa formação acessível a
quem não pode pagar os cursos privados convencionais. Para o gerente de
segurança do Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife
(C.e.s.a.r.), Rodrigo Assad, o software livre “não escolhe classe
social, idioma ou religião — bastam um computador conectado e a
participação nas comunidades de maior afinidade do candidato”. Além,
claro, “de muita perseverança”.

Outra vantagem da plataforma aberta é que poder mexer no código e
alterá-lo torna toda a história mais estimulante; e desestímulo é o
que, na opinião da pesquisadora Alexandra Reis, da IDC Brasil, está
esvaziando os cursos de graduação do setor. “Gosto da sensação de
liberdade, da idéia de poder explorar a programação sem restrições”,
diz Tauan de Andrade, de 16 anos, que participou de curso promovido
pela IBM no AfroTech, evento que aconteceu m julho, em São Paulo. Por
outro lado, segundo o coordenador de capacitação da Softex, Eratóstenes
Araújo, nos cursos de computação, a demanda média é de dois candidatos
por vaga. A Unicamp chega a ter 18 por vaga, mas é caso excepcional,
porque, em geral, a demanda é muito baixa. Por isso, a proposta da
Softex entregue ao MCT defende mudanças de currículo e novos cursos.
“Mesmo na Ciência da Computação, não há engenharia de software. É
preciso mexer na oferta existente”, argumenta Eratóstenes. Também prevê
a inserção de disciplinas técnicas no ensino médio. “Isso já acontece
nos Cefets (Centros Federais de Educação Tecnológica), mas poderia se
estender a qualquer escola”.

O MCT, segundo a Softex, precisaria gastar R$ 480 milhões no período
2006/2012, para inserir no mercado de desenvolvimento de soft­ware
cerca de 50 mil profissionais. Recursos que seriam providos por
governo, empresas de TI, e escolas/cursos. Eratóstenes avalia em R$ 10
mil o custo médio para colocar um profissional no mercado.

Linux nas empresas

De acordo com pesquisa da IDC Brasil (dados de 2006), aproximadamente
64% das empresas (de todos os portes) instaladas no país possuem alguma
solução baseada em Linux. Isso significa um crescimento superior a 50%,
em relação a 2004, segundo Alexandra Reis, gerente de consultoria da
empresa. A previsão, diz ela, é que o segmento siga se expandindo a uma
taxa média de 30% da base instalada ao ano, bem superior à área de TI
como um todo — entre 13% e 14%. “Servidores web, de e-mail e de
ambientes de colaboração são as principais aplicações das soluções
Linux”, aponta. Além disso, 49% do total do mercado provêm de serviços
ligados a Linux. Outra pesquisa da IDC indica que, até 2009, serão
abertas 630 mil novas vagas em tecnologia da informação na América
Latina, das quais 466 mil na área de software, sendo 210 mil no Brasil.
Atualmente, são 892 mil empregos no país, sendo 657 mil em programas de
computador.