Entidade oferece cursos de Linux
e Open Office para comunidade na periferia de Manaus e traz alento para
população que vive em meio a drogas e tiros. Lino Bocchini
As palafitas dominam a cena
no bairro de São José, periferia
de Manaus.
As palafitas e a falta de saneamento básico denunciam a pobreza do
bairro São José, periferia brava de Manaus. Casinhas simples de
madeira, ruas de terra, tráfico de drogas e tiroteios fazem parte da
rotina dessa que é uma das regiões mais carentes da capital amazonense.
Em meio a esse cenário, um grupo de voluntários se esforça para manter
ativo o Lefran, entidade que oferece cursos de informática e aulas de
dança, música e reforço escolar, entre outras atividades. O Centro
Popular de Cultura Legião Franciscana – seu nome oficial – já existe há
mais de sete anos, e há três trabalha exclusivamente com software livre.
“Não temos apoio nenhum de prefeitura, estado, governo federal, nada”,
fala Marivaldo de Andrade Agostinho, presidente do Lefran. “Só tivemos
duas doações de máquinas, por parte da Siemens e da Xerox, que têm
fábricas aqui na Zona Franca. Mas para a manutenção do espaço, temos
que nos virar”, lamenta Agostinho, que acaba de ser eleito conselheiro
tutelar da região. Com a falta de suporte, o Lefran é obrigado a cobrar
uma pequena taxa dos alunos. Um curso de informática de seis meses, por
exemplo, custa R$ 60,00. O dinheiro, pouco, mal cobre as despesas
básicas da modesta construção. Todo apoio técnico (instalação de
softwares, de hardware, etc.) é feito por voluntários. A maioria deles
é ligada à Comunidade Sol, organização manauara que estimula o uso do
software livre.
“Quando chegamos aqui eles usavam software proprietário, mas a licença
não era válida, era um problema”, explica o voluntário Rômulo Machado,
que faz um pouco de tudo no Lefran.”Aí, começamos a falar da filosofia
do software livre, explicar que era uma boa alternativa, que tem tudo a
ver com a comunidade local. Até porque, por conta dos custos, o Lefran
nunca teria condições de comprar licenças de Windows”, completa.
Montado o laboratório, foi aberto um curso básico de Linux e Open
Office. “Hoje, estamos na terceira turma de software livre, além de
termos capacitado alguns instrutores”, conta Rômulo.
No laboratório do Lefran, os
micros só rodam software livre.
A mudança de plataforma de software foi facilmente absorvida pelos
alunos, já que a maioria deles nunca teve contato com o computador. “Os
alunos começam puros”, brinca Oziel de Sá Dantas, pedagogo responsável
pelo projeto, capacitado pelos voluntários da Comunidade Sol. A
situação seria outra, na avaliação de Marlon Brandão, outro voluntário
do Lefran, “se a mudança tivesse sido feita em uma escola convencional
de informática”.
Para o futuro, o grande desejo da equipe do Lefran é que alguém (órgão
público ou empresa) enxergue a importância da iniciativa para o bairro
São José e não apenas doe maquinário, mas também ajude a manter o
laboratório. Um dos planos, caso as doações cheguem, é abrir um
cibercafé gratuito, além de parar de cobrar pelos cursos.
Uma das maiores provas do sucesso do Lefran é o fato de que, mesmo em
meio a uma região violenta, a entidade nunca foi roubada. A importância
de seu trabalho para a comunidade é confirmada pelo adolescente
Cristiano Melo, de 15 anos, que já fez curso de informática e, no
momento, freqüenta o curso de dança. O curso de software livre no
Lefran foi seu primeiro contato com um computador. “Oferecendo cursos,
você tira as pessoas da droga. É melhor ter uma coisa boa para fazer,
senão a pessoa pode acabar fazendo o que não deve”, acredita ele.