Há cerca de 7 mil rádios comunitárias transmitindo em todo o Brasil e somente 2,2 mil delas são autorizadas. Uma política nacional de rádios comunitárias deveria reconhecer esse movimento legítimo e ajudá-las a prestar serviços à sociedade.
Heliópolis, a maior favela de São Paulo, onde vivem 100 mil pessoas.
Os forrozeiros Francis Lopes, Lairton e seus Teclados e um adesivo do Mec Favela – o hambúrguer do bairro – enfeitam as paredes do estúdio da Rádio Heliópolis. A pequena sala fica na sede da União de Núcleos, Associações e Sociedades de Heliópolis e São João Clímaco, a Unas, ao lado da Estrada das Lágrimas. A Rádio Heliópolis, 97,9 FM, transmite desde 1997 para cinco núcleos da maior favela de São Paulo e seu entorno, onde vivem cerca de 100 mil pessoas. Fica 24 horas no ar, com programação ao vivo entre as seis da manhã e a meia-noite. Em 2004, foi escolhida pelo Ministério da Cultura para participar do programa Pontos de Cultura (veja a página 14), que financia a construção de estúdios de áudio e vídeo em áreas de baixo índice de desenvolvimento humano.
Ouvida por 34% dos moradores das áreas onde chega seu sinal, a Heliópolis é uma rádio ilegal. Sua situação é a mesma de muitas outras rádios comunitárias no Brasil, porque o governo não consegue liberar autorizações no mesmo ritmo em que as solicitações chegam ao Ministério das Comunicações. Há 2,6 mil pedidos de autorização em análise no ministério, que tem uma equipe de 28 pessoas para acompanhar o andamento. Há também 6,6 mil manifestações de interesse de entidades que gostariam de criar uma rádio, mas que ainda não se tornaram processos em andamento.
Os pedidos demoram de dois a três anos para tramitar. É muito tempo. Por isso, milhares de rádios são instaladas independente de autorização. As rádios comunitárias autorizadas, até dezembro de 2004, eram 2,2 mil. Não se sabe quantas rádios sem licença há no país, mas a estimativa do Fórum Democracia na Comunicação é de que são cerca de 7 mil.
Insurgência comunicativa
O professor José Carlos Rocha, presidente do Fórum Democracia na Comunicação, chama esse movimento de “insurgência comunicativa”. “O que moveu e move a maioria das pessoas envolvidas em radiodifusão de baixa potência no Brasil é, acima de tudo, o desejo de acesso aos meios de comunicação. As pessoas querem falar, ser ouvidas, passar seu recado, sentir que existem”, explica Márcia Detoni, na dissertação “Radiodifusão Comunitária: Baixa Potência, Grandes Mudanças?”, apresentada em 2004, na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo.
O professor José Carlos Rocha, presidente do Fórum Democracia na Comunicação, chama esse movimento de “insurgência comunicativa”. “O que moveu e move a maioria das pessoas envolvidas em radiodifusão de baixa potência no Brasil é, acima de tudo, o desejo de acesso aos meios de comunicação. As pessoas querem falar, ser ouvidas, passar seu recado, sentir que existem”, explica Márcia Detoni, na dissertação “Radiodifusão Comunitária: Baixa Potência, Grandes Mudanças?”, apresentada em 2004, na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo.
Não são somente militantes de movimentos comunitários que inauguram rádios. Em Fortaleza, de acordo com a socióloga Márcia Vidal Nunes, em artigo para a Revista de Sociologia e Política de junho de 2004, entre 50 emissoras comunitárias, apenas cinco tinham a gestão de grupos culturais e organizações populares. Em vez de dar voz para a comunidade e valorizar a cultura local, a maior parte dessas emissoras reproduz a programação das rádios comerciais ou, nos piores casos, vira moeda de troca: um radialista de Sobral, no Ceará, contou a Márcia Vidal que um candidato a vereador montou três rádios e vendeu- as, uma delas ao dono de um supermercado na cidade. Gastou R$ 15 mil para montar a rádio e revendeu por R$ 45 mil.
Outras milhares de rádios que não fazem parte desse balcão de negócios, no entanto, têm um papel importante, porque fortalecem as relações sociais da comunidade e os laços de solidariedade e pertencimento, explica Detoni. Por isso, uma política pública deveria estimular as rádios a tornar-se realmente comunitárias.
Há muito o que se fazer para que o sonho dos pioneiros do movimento das rádios livres, de criar rádios capazes de articular as comunidades e de criar novas linguagens e formatos, se realize, diz Tião Santos, coordenador da Rede Viva Favela de Rádios Comunitárias. “Precisamos retomar a idéia de capacitar e qualificar as pessoas e assim redefinir o perfil das rádios”, afirma. “Muitas serão simplesmente picaretárias, mas outras podem se tornar rádios cidadãs”, acredita ele.
O grupo de trabalho interministerial (GTI) criado em 26 de novembro pelo governo parece sintonizado com isso. De acordo com um representante do Ministério das Comunicações, ele não vai se limitar a encontrar meios de acelerar os procedimentos de outorga e aperfeiçoar os mecanismos de fiscalização, como prevê o decreto que o criou. “Vamos fazer um diagnóstico da situação das rádios no Brasil e propor um novo marco legal para o setor”, diz esse representante. “O trabalho vai culminar com a realização de uma conferência nacional de rádios comunitárias, antes do final do prazo de trabalho do grupo”, acrescenta. O GTI tem até o dia 2 de agosto para concluir seus trabalhos.
Eficiência na punição
Se o braço do Estado que legaliza ou incentiva as rádios é lento, o braço que reprime está sempre pronto a atuar: em 2003 e 2004, foram fechadas 2,26 mil rádios comunitárias no Brasil, número quase igual ao de rádios autorizadas desde 1998, quando foi criada a Lei das Rádios Comunitárias, a 9612/ 98, sancionada por Fernando Henrique Cardoso. As rádios são fechadas de forma truculenta: não faltam relatos de abuso de autoridade e violência por parte da Polícia Federal, que acompanha a Agência Nacional de Telecomunicações nas diligências. A vida das rádios autorizadas também não é fácil: a legislação brasileira proíbe a venda de propaganda, a transmissão com potência maior que25 W, antenas mais altas que 30 metros. Sua cobertura é restrita a um raio de quatro quilômetros a partir da antena (originalmente era de um quilômetro, mas foi ampliada em 2004). A lei determina, também, a existência de apenas uma rádio por localidade e obriga as emissoras a operar na mesma freqüência FM em todo o país.
Se o braço do Estado que legaliza ou incentiva as rádios é lento, o braço que reprime está sempre pronto a atuar: em 2003 e 2004, foram fechadas 2,26 mil rádios comunitárias no Brasil, número quase igual ao de rádios autorizadas desde 1998, quando foi criada a Lei das Rádios Comunitárias, a 9612/ 98, sancionada por Fernando Henrique Cardoso. As rádios são fechadas de forma truculenta: não faltam relatos de abuso de autoridade e violência por parte da Polícia Federal, que acompanha a Agência Nacional de Telecomunicações nas diligências. A vida das rádios autorizadas também não é fácil: a legislação brasileira proíbe a venda de propaganda, a transmissão com potência maior que25 W, antenas mais altas que 30 metros. Sua cobertura é restrita a um raio de quatro quilômetros a partir da antena (originalmente era de um quilômetro, mas foi ampliada em 2004). A lei determina, também, a existência de apenas uma rádio por localidade e obriga as emissoras a operar na mesma freqüência FM em todo o país.
A lei limita a atuação das rádios. Contemplou as reivindicações da Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), que reúne as rádios convencionais, as quais temem que a “concorrência” de rádios mais próximas das comunidades, com altos índices de audiência, lhes roube anunciantes.
Serviço à comunidade
Enquanto isso, a Rádio Heliópolis dá seu recado, 24 horas por dia. A maior parte de sua programação é musical, mas a rádio transmite informação e faz campanhas educativas. Toda terça-feira, há o programa Saúde nas Ondas do Rádio, em que profissionais do ambulatório da prefeitura esclarecem dúvidas sobre doenças sexualmente transmissíveis. “Nunca nos escondemos porque somos do bem”, diz Geronimo Barbosa, coordenador da Rádio Heliópolis. “Podemos estar descumprindo a lei, mas o serviço que prestamos à comunidade é mais importante”. Com os R$ 150 mil do programa Pontos de Cultura, a Heliópolis vai formar jovens em produção de conteúdo para rádios e fornecer programação para outras emissoras comunitárias. “Precisamos ajudar outras rádios a serem como a nossa”, diz Geronimo.
Enquanto isso, a Rádio Heliópolis dá seu recado, 24 horas por dia. A maior parte de sua programação é musical, mas a rádio transmite informação e faz campanhas educativas. Toda terça-feira, há o programa Saúde nas Ondas do Rádio, em que profissionais do ambulatório da prefeitura esclarecem dúvidas sobre doenças sexualmente transmissíveis. “Nunca nos escondemos porque somos do bem”, diz Geronimo Barbosa, coordenador da Rádio Heliópolis. “Podemos estar descumprindo a lei, mas o serviço que prestamos à comunidade é mais importante”. Com os R$ 150 mil do programa Pontos de Cultura, a Heliópolis vai formar jovens em produção de conteúdo para rádios e fornecer programação para outras emissoras comunitárias. “Precisamos ajudar outras rádios a serem como a nossa”, diz Geronimo.
Rádio Heliópolis • 11-272-0148 ou 274-1176
Rede Viva Favela • 21-2555-3787
Fórum Democracia na Comunicação • 11-3105-6465
www.anatel.gov.br • Anatel, onde há informações
sobre freqüências e fiscalização.
www.mc.gov.br • Ministério das Comunicações, com
um link exclusivo para a área de Radios Comunitárias.
Legislação e acompanhamento de processos.
www.abert.org.br • Associação das rádios comerciais,
que articula ações de repressão a rádios ilegais e publica
notícias sobre denúncias.
Rede Viva Favela • 21-2555-3787
Fórum Democracia na Comunicação • 11-3105-6465
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