Web 2.0: quem sabe faz agora.

A 1ª Conferência Web 2.0 discute os caminhos da interatividade e da intervenção do público nos conteúdos publicados online.


A 1ª Conferência Web 2.0 discute os caminhos da interatividade e da intervenção do público nos conteúdos publicados online.  Leandro Quintanilha


Os dígitos 2.0 são uma alusão ao motores automobilísticos. Web 2.0
sugeriria, portanto, uma versão mais potente e veloz da internet até
então conhecida, a 1.0. Mas não é bem isso. O conceito de Web 2.0,
supostamente cunhado pelo editor Tim O’Reilly, um dos nomes mais
recorrentes da literatura tecnológica da atualidade, diz respeito não à
velocidade em si, mas a um desdobramento cultural dela: a crescente
possibilidade de interação. Mais do que isso – o compartilhamento, com
o usuário, da responsabilidade pela gestão do conteúdo publicado na
internet.

Nos dias 28 de fevereiro e 1º de março, ocorreu em São Paulo a 1ª
Conferência Web 2.0, promovida pela Converge Comunicações, empresa que
edita as publicações “TI Inside”, “Teletime” e “Tela Viva”. O encontro,
que contou com a participação de grandes empresas do setor (Adobe,
Apontador, Google, IBM, IG, Intel, Terra, Vivo e Yahoo, entre outras),
reuniu, também, especialistas e pesquisadores da área.


Ohmy News: jornalismo feito
pelos leitores.

Três anos depois de seu surgimento, a expressão ainda pauta um debate
semântico. Na palestra de abertura, Evolução ou Revolução, Abel Reis,
diretor de tecnologia e projetos da Agência Click, definiu Web 2.0 como
“uma denominação ampla, que abarca todas as aplicações que propiciam e
potencializam a formação de redes sociais digitais”. Esse é, acredita,
uma conseqüência das transformações técnicas, econômicas e
comportamentais desta época. Ben Forta, técnico sênior da Adobe Inc.,
na palestra A Transformação da Web, citou O’Reilly, ao afirmar que, na
Web 2.0, a internet supera, enfim, a metáfora das ‘páginas’: “A
arquitetura de participação que caracteriza esse novo conceito é uma
forma de atribuir poder ao público.” Para ele, o YouTube é um ícone dos
novos tempos. “Seu sucesso é, na verdade, fruto do que seria
considerado um erro no passado – permitir que o usuário ‘manipule’ o
conteúdo.”

O jornalista e acadêmico Carlos Nepomuceno, coordenador do Instituto de
Inteligência Coletiva (ICO), brincou: “A Web 2.0 é o patinho feito que
virou cisne.” Com isso, ele quer dizer que o que antes era considerado
nocivo, a suposta fragilidade do conteúdo online diante de um usuário
‘invasor’, é, agora, o objetivo. “Eu quero decretar a morte dos
gestores de conteúdo”, acrescentou, durante a palestra A Web 2.0 como
Fator do Desenvolvimento Brasileiro.


You Tube e Digg: conteúdos
publicados e escolhidos pela
comunidade

Nepomuceno disse, ainda, que foi o Orkut o responsável, no país, pelo
que se esperava de uma primeira fase do processo de inclusão digital da
população. “A segunda fase seria passar do entretenimento e do
exibicionismo para a participação no conteúdo e a troca de
conhecimento.” A internet deixaria de ser mais um meio de comunicação,
ou uma convergência de mídias, para se tornar o principal meio de
interação entre seres humanos. “Só uma mudança de paradigma na
comunicação pode explicar como projetos tão inovadores partiram do nada
e alcançaram escala global”, disse ele, referindo se a fenômenos como
Google, Skype, Orkut, Amazon, E-Mule, Wikipédia e o próprio Linux.
“Isso sugere o grande potencial de gerar inovações e produzir
conhecimento com comunidades em rede.”

Para Nepomuceno, a Web 2.0 resulta, ainda, do maior tempo que os
usuários passam online, graças a conexões mais rápidas e relativamente
mais baratas, com o pagamento de mensalidades fixas. No Orkut, os
brasileiros assinam mais de 60% dos perfis. Estados Unidos e Índia
ficam com o segundo e terceiro lugares — com aproximados 14% e 10%.
Pesquisa do Ibope/NetRatings, realizada no ano passado, revelou que o
Brasil é o país em que os usuários de internet passam mais tempo
conectados — 20 horas e 25 minutos por mês.

“Se a segunda vida faz tanto sucesso, é porque a primeira não deve
estar lá essas coisas”, disse Marcelo Coutinho, diretor da Unidade de
Inteligência do Ibope, na palestra O Perfil do Usuário da Internet. A
brincadeira de Coutinho é uma referência ao Second Life (Segunda Vida,
em inglês), jogo virtual que simula a vida real em três dimensões. Ele
frisou que iniciativas de inclusão digital são essenciais para a maior
popularização da internet e a redução do que chama de “feudalismo
absolutista informacional”.


Para o jornalista Paulo Henrique Amorim, que falou sobre seu blog
político Conversa Afiada (portal iG), a Web 2.0 é um meio de
democratização da mídia. “O sucesso dos blogs, no Brasil, se deve, em
grande parte, ao mau jornalismo praticado no país”, disse. “Hoje, toda
a grande imprensa nacional, exceto a revista (Carta Capital), investe
contra a permanência de Lula na Presidência.” Amorim vislumbrou um
futuro otimista para a Web 2.0, graças à combinação de produtos
altamente segmentados com a máxima capacidade de penetração em seus
respectivos públicos-alvos. O resultado? “Mais dinheiro e mais
democracia.”

Por falar em prognósticos, Reis, da Agência Click, apontou o que se
espera para as Webs 3.0 e 4.0. Na primeira, mecanismos de busca mais
inteligentes, capazes de compreender a semântica das palavras-chave
(hoje, as pesquisas misturam ‘São Paulo’, a cidade, com o time de
futebol e o santo homônimos) e o conteúdo intrínseco das imagens (não o
nome do arquivo). Na versão 4.0, “a internet será um sistema global de
softwares”, ou um gigantesco sistema operacional, “em que o todo será
maior que a soma das partes”.

Profecias

Durante a 1ª Conferência Web 2.0, o jornalista Carlos Nepomuceno lançou
o livro “Conhecimento em Rede – Como Implantar Projetos de Inteligência
Coletiva”, escrito em parceria com Marcos Cavalcanti. Ele adiantou as
sete previsões para o futuro da internet contidas na obra (material
adaptado):

1 – Quem souber organizar as melhores comunidades em rede fará a diferença.
2 – As instituições funcionarão como enxames coletivos,
conectados em rede, para conseguir mudar de direção na velocidade que a
sociedade exigir.
3 – Não existirá mais ‘conteudista’ — o usuário colocará no ar a maior parte do conteúdo.
4 – As comunidades serão organizadas e moderadas por lideranças locais.
5 – Portais e intranets serão muito parecidos com sites de relacionamento.
6 – Os países se diferenciarão uns dos outros pela capacidade de sua população se articular em rede.
7 – Os países incorporarão a criação de redes inteligentes entre cidadãos ao seu planejamento estratégico, para competir num mundo plugado.

Lei 1.0

“A tecnologia 2.0 facilita a produção de conteúdos nem sempre
legítimos”, alertou o advogado Dirceu Rosa na palestra Direito Autoral
e Propriedade Intelectual, durante a 1ª Conferência Web 2.0. Dirceu é
coordenador da Comissão de Software e Informática da Associação
Brasileira de Propriedade Intelectual (ABPI). “As leis brasileiras que
regulam direitos autorais ainda não estão adaptadas para os novos usos
e situações da Web 2.0.” A lei, ressaltou, é sempre mais lenta que a
tecnologia.

O advogado lembrou que a liberdade de expressão é uma garantia constitucional — mas o anonimato não. Isso vale para sites
e blogs, precursores do conceito ‘2.0’ de usuário-colaborador.
“Comentários ofensivos publicados na rede, por exemplo, podem gerar
responsabilidade civil e criminal.”

Outra advertência: cópia indevida ou não-reconhecida de conteúdo pode
violar o direito autoral de terceiros. “Mudanças estão sendo estudadas
para descriminalizar o download
em si”, disse o advogado, que coordena também a Comissão de Direito
Autoral e Entretenimento da Ordem dos Advogados do Brasil do Rio de
Janeiro (OAB-RJ). Mas a facilitação dele pode continuar sendo entendida
como crime.

Mas, hoje, quem responde por eventuais crimes? “Ainda não é possível
definir até onde vai a responsabilidade do provedor do serviço e onde
começa a do usuário que pratica um crime na rede.” Dirceu, no entanto,
lembrou que os sites de relacionamento, como o Orkut e o MySpace, são
passíveis de ações judiciais embasadas no Código do Consumidor. Detalhe
importante: a jurisprudência indica que clicar em “concordo” ou “li e
aceito” funciona como uma assinatura de contrato, tenha o usuário lido
ou não o documento.

Inteligência coletiva

O Instituto de Inteligência Coletiva (ICO) é uma iniciativa de
pesquisadores, empresários e militantes interessados em difundir
conhecimento em rede na sociedade brasileira. O ICO realiza palestras,
cursos e publica livros sobre a formação de redes sociais na internet,
mas seu principal trabalho é o desenvolvimento da ferramenta ICOX, software livre e gratuito, capaz de gerenciar comunidades em rede. Funciona como uma espécie de site
de relacionamentos que interliga aldeias indígenas, telecentros
comunitários, centros culturais, cooperativas, ONGs e ativistas sociais
e ecológicos, para a troca de idéias e experiências online.

www.icox.org.br

www.convergeeventos.com.br – Converge

www.ibope.com.br – Ibope

www.agenciaclick.com.br – Agência Click

www.conversa-afiada.ig.com.br – Conversa Afiada

www.ico.org.br – Instituto de Inteligência Coletiva