WikiLeaks vaza rascunho secreto do TPP. O que há de novo?

13/11 -  O acordo reforça o ataque direto à intimidade dos cidadãos em prol da propriedade intelectual.

Angela Bernardo
Do Alt 1040

13/11/2013 – Há algumas horas, o WikiLeaks vazou o rascunho secreto do novo acordo Trans-Pacific Partnership (Parceria Trans-Pacífico), o documento que seria assinado por 12 países sobre direitos de propriedade intelectual do TLC Transpacífico, entre os quais se incluem os Estados Unidos, Canadá, Japão, México, Austrália, Malasia, Chile, Singapura, Peru, Vietnam, Nova Zelândia e Bahrein.

Veja entrevista sobre o TPP na revista ARede.

Chama atenção a exclusão da China desse acordo de livre comércio, tendo em vista o posicionamento sobre temas relacionados com a propriedade intelectual, em especial os acordos relativos ao direito de patentes.

No documento de 95 páginas são abordados assuntos referentes a copyright, patentes, diversos acordos comerciais e sobre desenho industrial, temas que já estavam tratados no acordo sobre os ADPIC e no acordo Trips.

Por que então lançar o acordo TPP? Quais são as novidades? Analisando o documento vazado pelo WikiLeaks, que se presume que seria debatido e aprovado na próxima semana, em uma cúpula em Salt Lake City (Estados Unidos), vemos os diferentes posicionamentos dos países envolvidos nas negociações.

O documento é verdadeiramente relevante pois traz aspectos relacionados à propriedade intelectual em serviços de internet, acesso a medicamentos ou a publicações, afetando diretamente direitos individuais.

Chama atenção a ausência da China, mas a leitura do rascunho não faz senão reafirmar que o TPP pode violar de maneira clara liberdades de cidadania e supõe um favorecimento dos interesses comerciais dos EUA.
 
O novo acordo TPP, que pretende manter relações comerciais diferentes das colocadas pelo marco internacional vigente, poderia invalidar alguns critérios do acordo Trips. Por exemplo, no artigo QQ.A.6, sobre direitos e obrigações de cada país, o México sugere aplicar o critério jurídico mutatis mutandis com respeito ao Trips. Que significa isso? O acordo Trips, onde se elevaram os critérios de patenteabilidade, deveria ser obedecido “com as mudanças necessárias”. Supõe-se que, em relação às patentes, os países signatários do TPP poderiam ir além dos critérios aprovados pelo Trips.

É significativo, por exemplo, que quando se fala em respeitar acordos multilaterais realizados por organizações como a Organização Mundial de Saúde, a Organização Mundial de propriedade Intelectual ou a Unesco, México e Estados Unidos se oponham fortemente. Entende-se que pesam mais os interesses comerciais que os direitos e liberdades dos cidadãos.

No artigo QQ.A.9, diante da proposta da maioria dos países de eliminar as práticas que bloqueiem a transferência internacional de tecnologia ou qualquer atividade que vá contra a livre competência, voltamos a ter uma posição muito clara dos Estados Unidos e, neste caso, também do japão.

A defesa dos interesses comerciais, especialmente dos EUA, como comentávamos no início, fica mais evidente no capítulo das patentes de medicamentos. Nesse caso, o TPP faz alusões em várias ocasiões à extensão da duração das patentes em função do tempo que demore, ao ser aprovada, para chegar ao mercado. Essa redação, que beneficia uma boa parte de empresas, não leva em conta, sem dúvida, os problemas que poderiam acontecer no acesso, por exemplo, a medicamentos genéricos. Por esse motivo, reiteramos a perplexidade ante um documento que aponta para os interesses comerciais de alguns, omitindo-se diante dos interesses gerais da população.

O que acontece com os direitos digitais?

Mídias chilenas relataram surpresa ante o TPP, que favorece de maneira muito marginal os interesses de países como Chile e Peru, em favor de potências como México e Japão.

Acontece, na realidade, que o TPP é uma renegociação de outros acordos de livre comércio já subscritos, que visa, por exemplo, estender os prazos de proteção de publicações a 95, 100 e 120 anos em casos específicos.

Também faz referência a diversos critérios sobre limitação dos ISPs, assuntos já discutidos em acordos bilaterais entre Chile e EUA e que o novo acordo TPP poderia, novamente, anular.

Não há dúvida de que hoje, quando a espionagem da NSA afetou muitos direitos individuais relacionados com a intimidade, a privacidade em rede é um tema sensível. Mas se os EUA se defendem dos ataques em nome de sua segurança nacional, o TPP reaforça o ataque direto à intimidade dos cidadãos em prol da propriedade intelectual, como diz o artigo QQ.G.10.d.V.

Como vemos, o documento vazado pelo WikiLeaks sobre o novo acordo TPP volta a acender as luzes amarelas a respeito de quais são os principais interesses políticos. É curioso que, com base nesse documento, negociado sob o mais absoluto sigilo, países como Chile, Peru ou México cedam a pressões de terceiros. Fica claro que a cidadania, de novo, poderia perder outra vez em função de interesses ocultos.